Preta, pobre e puta: a segregação urbana da prostituição em Campinas
Boletim nº 6 – 21 de novembro de 2019
No ano de 1960, o poder público de Campinas definiu a “Zona” da cidade, com o objetivo de concentrar numa área periférica todas as atividades ligadas à prostituição na cidade, garantindo seu zoneamento fora do espaço urbano consolidado. Essa “invenção” é o ponto de partida da pesquisa “Preta, pobre e puta: a segregação urbana da prostituição em Campinas”, de Diana Helene Ramos, vencedora do Prêmio Capes de Tese 2016 na área de PUR/Demografia.
O trabalho de Diana Helene Ramos contou com a orientação da Profa. Dra. Soraya Silveira Simões e da Profa. Dra. Ana Clara Torres Ribeiro (in memoriam). E representa mais um resultado importante do Observatório da Prostituição, vinculado ao IPPUR/UFRJ.
PUTA TEM DIREITO À CIDADE?
De acordo com a pesquisadora, o interesse pelo objeto de estudo da tese surgiu devido à uma peculiaridade dessa Zona: ela foi criada estrategicamente no final dos anos 1960 pelo poder público, com o objetivo de concentrar numa área periférica todas as atividades ligadas à prostituição na cidade, garantindo seu zoneamento fora do espaço urbano consolidado.
“Nesse sentido, ao analisar a cidade de Campinas, no interior do estado de São Paulo, procuro entender sua história a partir da segregação urbana da prostituição – a saber, a ‘invenção’ de uma área confinada para as atividades prostitucionais chamada Jardim Itatinga – como uma forma de organização da cidade que se articula com diversas demarcações de desvio, estigma e impureza”, explica Diana Helene Ramos.
“Essa política de segregação resultou na perseguição das prostitutas que, contudo, persistem trabalhando fora dali. Entre suas estratégias de proteção e permanência, a mais expressiva é a fundação da Associação Mulheres Guerreiras, localizada no centro da cidade”, descreve.
A tese examina, portanto, as tensões, os conflitos, as táticas e as estratégias de um grupo social historicamente estigmatizado e com forte presença em áreas urbanas centrais, face às intervenções do planejamento urbano.
Sua circulação nos diferentes locais de prostituição em Campinas, suas estratégias para o estabelecimento de “pontos” de permanência em espaços não planejados oficialmente para sua presença, suas redes e articulações com outros pares “desviantes” e, principalmente, suas táticas de resistência à expulsão e luta por reconhecimento são objetos de atenção.
De acordo com Diana Helene Ramos, a ideia do trabalho foi compreender como se estrutura, nos espaços físicos e políticos da cidade essa disputa particular – “marcada por recortes de classe, de raça e especialmente de gênero – que tem a prostituição como foco de interesse. Tentei, por fim, possibilitar o vislumbramento de uma organização urbana generificada que se justifica em discursos ora sanitários, ora econômicos, ora morais e cuja história registra a constante tensão entre o planejamento urbano oficial e os habitantes da cidade, com suas reivindicações pelo direito a nela existirem”, argumenta a pesquisadora.
A tese de Diana Helene Ramos está disponível na Base Minerva da Biblioteca IPPUR. Acesse aqui.